quinta-feira, 24 de julho de 2014

Ahhh riano. Por quê?




Pobres? Mentirosos? Coitados? Sofredores? Ardilosos? “Joões Grilos”, nós somos. Não por maldade, tampouco por interesse.  João representa os oprimidos e tenta viver de forma fantasiosa utilizando uma das poucas armas que os brasileiros pobres possuem para se proteger: a astúcia.

Covardes?  Mentirosos? “Chicós”, nós também somos. Tudo é uma questão de sermos precavidos.

Na luta pelo pão nosso de cada dia carregamos um pouco dos “pseudo-heróis-nacionais-suassuninos”. Criamos inúmeros planos para conseguir sobreviver em meio aos diversos dissabores que surgem. Frente a estes novos desafios, tentamos de modo astuto, bem “Grilês”, nos dar bem, mas acabamos caindo em uma confusão maior ainda.

Muitas vezes nem sentimos o sabor do pão que o diabo amassou, pois a burguesia, dona da padaria, prefere dá-lo aos animais.

Brincamos com o que não poderíamos. Tudo firmado na imaginação de que o bom Deus, brasileiro como nós, perdão na sua mais humilde essência, nos reserva.

A paixão e a avidez por um chamego faz com que o mais astuto, bobo se torne. Mas temos um amigo sempre pronto a nos ajudar. Claro que a porquinha recheada se torna um atrativo para essa força “despretensiosa”.

A lábia “Grilês” tenta derrubar até o mais cruel dos vilões. Vilão? Na verdade um pouco vítima social, ao bem da verdade. Mas erros, nunca foram capazes de justificar outros.

E se a coisa ficar feia? Temos a Compadecida para nos salvar. Ela, uma mulher simples, do povo e um poço de compaixão, compreende as faltas humanas.

JOÃO GRILO: - E difícil quer dizer sem jeito? Sem jeito! Sem jeito por quê? Vocês são uns pamonhas, qualquer coisinha estão arriando. Não vê que tiveram tudo na terra? Se tivessem tido que aguentar o rojão de João Grilo, passando fome e comendo macambira na seca, garanto que tinham mais coragem. Quer ver eu dar um jeito nisso, Padre João?

PADRE: - Quero, Joca.

JOÃO GRILO: - Agora é Joca, hem? E você, Senhor Bispo? 

BISPO: - Eu também, João.

JOÃO GRILO: - Padeiro?

PADEIRO: - Veja o que pode fazer, João.

JOÃO GRILO: - Severino? Mulher e cabra?

MULHER: - Nós também. Nossa esperança é você.

JOÃO GRILO: - Tudo precisando de João Grilo! Pois vou dar um jeito.

ENCOURADO: - É isso que eu quero ver.

MANUEL: - Com quem você vai se pegar, João? Com algum santo?

JOÃO GRILO: - O senhor não repare não, mas de besta eu só tenho a cara. Meu trunfo é maior do que qualquer santo.

MANUEL: - Quem é?

JOÃO GRILO: - A mãe da justiça.

ENCOURADO (rindo): - Ah, a mãe da justiça! Quem é essa?

MANUEL: - Não ria, porque ela existe.

BISPO: - E quem é?

MANUEL: - A misericórdia.

SEVERINO: - Foi coisa que nunca conheci. Onde mora? E como chamá-la?

JOÃO GRILO: - Ah isso é comigo. Vou fazer um chamado especial, em verso. Garanto que ela vem, querem ver? (Recitando).
Valha-me Nossa Senhora,
Mãe de Deus de Nazaré!
A vaca mansa dá leite,
A braba dá quando quer.
A mansa dá sossegada,
A braba levanta o pé.
Já fui barco, fui navio,
Mas hoje sou escaler.
Já fui menino, fui homem,
Só me falta ser mulher.

ENCOURADO: - Vá vendo a falta de respeito, viu? 

JOÃO GRILO: - Falta de respeito nada, rapaz! Isso é o versinho de Canário Pardo que minha mãe cantava para eu dormir. Isso tem nada de falta de respeito!
Já fui barco, fui navio,
Mas hoje sou escaler.
Já fui menino, fui homem,
Só me falta ser mulher.
Valha-me Nossa Senhora,
Mãe de Deus de Nazaré.

(Nossa Senhora, A Compadecida, entra)

ENCOURADO ( com raiva surda): - Lá vem a compadecida! Mulher em tudo se mete!

JOÃO GRILO: - Falta de respeito foi isso agora, viu? A senhora se zangou com o verso que eu recitei?

A COMPADECIDA: - Não, João, por que eu iria me zangar? Aquele é o versinho que Canário Pardo escreveu para mim e que eu agradeço. Não deixa de ser uma oração, uma invocação. Tem umas graças, mas isso até a torna alegre e foi coisa de que eu sempre gostei. Quem gosta de tristeza é o diabo!

Ariano passa a ideia de que o sertanejo por degustar dificuldades durante a vida deve ser perdoado de alguns pecados. As dores passadas, por si só, são capazes de absolver alguns pecados.


O julgamento que enfrentamos é sempre moral, onde todas as formas de vícios e vaidades são condenadas.

Obrigado Ariano! Ficou gravada a lição: Somos “Joões Grilos” e Chicós”, por isso vencemos o sofrimento com o sorriso e salvamo-nos pela simplicidade e humildade.